sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Ainda sobre a sombra e exemplos doloridos 1, 2 e 3 no Japão

Saudações da ilha de Kyushu. Estava na última estação de trem bala no extremo Sul do Japão. Amo andar de trem e  o shinkansen é particularmente especial, vocês não fazem ideia de como fico feliz de percorrer as cidades japonesas de trem bala. Pensa numa criança que fica feliz com o novo brinquedo....sou eu com o meu bilhetinho de shinkansen. Essa foto abaixo é de Beppu que amei conhecer.


O fato é que passeando aqui no Japão hora procurando fumacinhas que saem do chão em Beppu, hora andando de bicicleta ao redor do vulcão ativo Sakurajima, hora refletindo quando estou num onsen de pé...não consigo parar de pensar no Peter Schlemihl e na sua história maravilhosa. Então eu, eu mesma e minha sombra decidimos continuar as reflexões do livro, espero que vocês não se importem!

No final do livro tem um posfácio escrito por Thomas Mann que é um baita escritor alemão que ganhou o nobel de Literatura em 1929 (só isso e outros prêmios) e vou dividir com vocês  alguns trechos que ele analisa do livro:
"jamais poeta algum soube, de maneira tão singela, verdadeira, sensível, pessoal, representar uma tal existência e trazê-la para tão perto de nossos sentimentos."
Deve ser por isso que não consigo parar de pensar nessa história. Thomas Mann continua:
 "O decisivo nisso tudo é que o poeta conseguiu enredarnos tão completamente à concepção do valor e da sua importância de uma sombra saudável para a honradez de uma pessoa, que deixamos de sentir exagero em expressões como "segredo sombrio", mas muito pelo contrário, enxergamos um homem sem sombra o mais derrotado, o mais repugnante ser sob o Sol."
Muito verdade essa fala do Thomas Mann, fiquei arrasada todas as vezes que lia as situações  em que o Peter Schlemihl se frustrava com o desprezo, com a exclusão quando as pessoas da sociedade percebiam a ausência da sombra dele. E o Thomas Mann fala: "Seu arrependimento por causa daquele negócio é infinito" e aí ele traz uma situação muito legal que acontece no livro que o Peter Schlemihl encontra um pintor e pede para ele desenhar uma sombra artificial. Adoro essa parte, como se fosse fácil pintar uma sombra, mas é incrivelmente engraçado esse trecho. O pintor fala: "Quem não tem sombra, que não saia ao Sol, essa é a coisa mais sensata e segura".
Vou dar três exemplos que eu vivenciei super dolorido de escutar sendo eu brasileira sobre os brasileiros que vivem no Japão.

Exemplo dolorido 1: Estava eu numa festa de confraternização de pessoas que estudam e falam espanhol em Nagoya a convite de uma amiga espanhola e de uma amiga japonesa, pessoas muito queridas que fui me despedir. Nessa festa conheci mutos estrangeiros e muitos japoneses que estudam espanhol. Aliás tinha uma japonesa de 66 anos que falava super bem o espanhol, elegante, com uma pele que parecia ter 30 anos...ela é dermatologista famosa que dá até entrevista na TV japonesa. Fiquei impressionada com ela, ela teve que sair mais cedo do evento porque tinha outro encontro em Tokyo e tinha que pegar o shinkansen! Que chiquérrima, alegre, simpática e plena: japonesa que fala mais de um idioma e com uma aparência absurdamente jovial, super bem resolvida. Não é todo dia que se encontra japonesas assim e que ainda me revelou os segredos dessa jovialidade toda pelo simples fato de que ela fala espanhol!
A parte dolorida vem agora, conversei também com um japonês super descolado que também falava inglês e espanhol. Depois de um tempo conversando vem sempre aquela pergunta de onde você é e quando eu falei que era brasileira ele se assustou comigo. Ele não entendia porque eu falava espanhol e inglês e ainda por cima era brasileira. Ele queria muito entender por que eu falava inglês e espanhol. Daí eu falei: "Por que? Porque eu estudei esses idiomas." Ainda falei que estudo doutorado no Brasil e que ensinava português no Japão. Aí ele se assustou mais ainda, o japonês virou pra mim SUPER impressionado e disse: "Você é uma brasileira diferente dos que eu conheço aqui, não conheço brasileiros como você"  e eu atenta tentando entender a surpresa dele e o japonês continuou exatamente nesses termos: "Os brasileiros que eu conheço aqui no Japão são burros". Ele usou exatamente esse termo em espanhol que é o mesmo em português.
Respirei fundo ao escutar essa frase, respira fundo você também leitor, fique a vontade se quiser tomar uma água ou um café antes de seguir lendo. Quando o japonês falou exatamente essa frase eu fiquei tão chateada, mas tão chateada a ponto de ficar com uma tristeza enorme dentro de mim por ele ter falado isso do meu povo.  Eu sou brasileira, não gosto que falem mal de nós da maneira como tive que escutar. Mas o interessante é que na percepção do japonês ficou muito claro que os brasileiros que ele conhece aqui no Japão não estudaram e não estudam. Infelizmente a grande maioria dos brasileiros no universo das fábricas no Japão, deixaram os estudos de lado, ou começaram e desistiram, ou estudaram algo que não gostaram e optaram pelas fábricas japonesas nos dias de hoje ainda. A "bolsa mágica" do Japão é fantástica, é assim que muitos pensam.
Reflexão: Nessa parte do estudar, infelizmente muitos brasileiros atualmente no Japão consideram desnecessário estudar e sempre vão ter um bom argumento para justificar o "não estudar". Os argumentos são ótimos e super convincentes, eles são bem articulados em geral e falam: "temos que fazer "zanguio" não dá" (zanguio é hora extra, muitas vezes 4 horas extras por dia porque paga mais), "tenho que pagar a prestação da casa", "tenho que pagar as contas". Comprei tal coisa e estou pagando. A desculpa sempre são: o dinheiro e as contas. É essa desculpa que permite esse japonês falar o que falou e digo mais, muitos japoneses tem exatamente essa visão sobre os brasileiros, de que os brasileiros são burros. Já escutei outros japoneses falando isso nesses meus 10 meses de Japão.
É preciso entender que se hoje os descendentes de japoneses são bem vistos no Brasil e super inseridos na sociedade brasileira foi porque os descendentes aprenderam o português. Desconheço japoneses bem sucedidos no Brasil que não aprenderam o português. Então o que precisa para os brasileiros que optaram por ficar no Japão terem uma visão diferente para os japoneses? ESTUDAR O IDIOMA JAPONÊS. Sem dominar o japonês, infelizmente terei que concordar com muita dor no coração com a fala do japonês acima. É preciso colocar os japoneses no lugar deles no idioma deles, será que vocês me entendem? São 30 anos de história de brasileiros no Japão, será que vamos  ter que esperar 80 anos para os brasileiros entenderem isso?
Vamos ao próximo exemplo. Agora escrevo da minha poltrona do shinkansen saindo de Kagoshima e rumo a Tokyo. Não consegui reservar assento, mas por sorte como Kagoshima é a última estação consegui um lugar na janelinha! Adoro viajar na janela! Até chegar em Osaka eu espero publicar esse post, sigamos com os outros exemplos.
Exemplo dolorido 2: Eu nunca vou esquecer de duas frases que escutei aqui no Japão de amigos muito queridos que me ajudaram demais aqui:
Frase 1: "Iara, sabe o que eu mais queria aprender mesmo? Você não vai acreditar. Eu queria aprender o português!"
Frase 2: "Iara, eu passo em todas as provas de teste, mas não consigo escrever uma redação e passar na prova."
Reflexão: Essas duas frases me tocaram e me doeram demais, nunca vou esquecer disso. Fico até emocionada quando lembro! Tá vendo como a questão da sombra sempre vai esbarrar na linguagem e no modo de se expressar seja de maneira falada ou de maneira escrita. É muito dolorido ver pessoas queridas sem a sombra, sem estudo. Eles sentem uma tristeza por isso, é visível. Eles e muitos outros exemplos são parecidos, muitos que gostariam de ter estudado mas o trabalho nas fábricas não deixa essas pessoas terem sombra. A sombra ainda dá para recuperar porque nunca é tarde para voltar a estudar. Mas se insistirem na "bolsa mágica" por mais tempo, pode ser que a alma já tenha sido comprada pelas fábricas. Detalhe, eu fiz um intensivo de redação para a pessoa da frase 2 mas ainda não sabemos o resultado, mas independente do resultado foi uma alegria muito grande poder ajudar mesmo que em pouco tempo uma pessoa a escrever uma redação.

Exemplo 3: Uma jovem super inteligente, esforçada, dedicada falou assim nesses termos:
"Mas meus pais falaram que não vale a pena estudar. Eles estudaram faculdade e não deu certo, estão aqui nas fábricas trabalhando." Quase tive uma parada cardíaca quando escutei essa frase leitores, sério! É preciso muita calma nessa hora quando se adentra o universo das pessoas que estão iludidas pela "bolsa mágica" e quando é uma jovem com uma sombra linda, com uma inteligência escancarada falando isso, eu sinto que sofro um terremoto dentro de mim, balança tudo dentro de mim. Aí eu tenho que parar e esperar esse terremoto passar e aí eu perguntei:
"O que seus pais estudaram? Qual faculdade?" Essa jovem super inteligente  não sabia me responder essa pergunta simples. Provavelmente os pais não estudaram, não tem sombra, mas tem uma filha muito inteligente que até eles devem se assustar e para ofuscar o brilho dessa linda sombra, falam que não vale a pena estudar.
Reflexão:  Os brasileiros que tem filhos no Japão querem muito que eles estudem e muitos não desejam para seus filhos o trabalho nas fábricas. Mas é doloroso escutar de filhos, me contando, que os pais falaram que não valeria a pena estudar. Aí dói demais na minha alma. Quando eu vejo jovens deixando de estudar e trabalhando nas fábricas,  eu enxergo o Peter Schlemihl que não viu nenhum problema em vender sua sombra pela "bolsa mágica". A bolsa mágica no Japão permite que muitos jovens comprem moto, carro, celulares, computadores! É impressionante ver como eles conseguiram comprar tantas coisas, mas alguns até dizem: "mas vou juntar um dinheiro para voltar ao Brasil e estudar". Mas os anos vão se passando, vão se passando e acontece que  muitos vão assinar o documento que o Peter Schlemihl se recusou a assinar. Ele mesmo diz que espera que seu ensinamento  seja útil para alguns habitantes e diz: "Mas você, meu amigo, se deseja viver entre os homens, aprenda a respeitar em primeiro lugar a sombra (...) Mas, se quiser viver para si e para o que há de melhor em seu interior, então não precisa de nenhum conselho."
Em outras palavras o Peter Schlemihl está dizendo, se você continuar fechado no seu universo, você não precisa de nenhum conselho. Há um universo paralelo de brasileiros no Japão que não conseguem enxergar além do ambiente de fábrica, estão presos. Há os que saíram das fábricas fisicamente mas o ambiente das fábricas não saíram das pessoas e mesmo que trabalhem "com o ensino", por exemplo, reproduzem o mesmo ar das fábricas e esse ar eu pude respirar e vivenciar durante um certo tempo no Japão. Antes que esse ar pudesse me contaminar, vocês não fazem ideia o que é respirar esse ar, eu, eu mesma e minha sombra decidimos largar esse ambiente tóxico e partir para vivenciar outras experiências incríveis de educação que o Japão tem a oferecer, mas só quem tem sombra vai me compreender.
Observações:
1. Serei muito grata ao Japão e as pessoas que me convidaram para aprender como é essa realidade, esse foi o argumento que me convenceu a vir ao Japão. Eu realmente aprendi muito!
2. Os exemplos doloridos não acabaram e acho que até eu deixar esse livrinho tão inspirador no dia da minha partida, eu vou ficar falando da sombra e do Peter Schlemihl....hehehe
3. Obrigada se você leu todos esses posts, arigato!
4. No post anterior na placa em Beppu estava escrito "ao Beppu", consultei duas amigas, uma tradutora e uma linguista e assim como existe Bem-vindo ao Rio de Janeiro, pode ser que Beppu seja o equivalente ao Rio de Janeiro e por acaso a cidade e os morros me fizeram realmente me lembrar do Rio de Janeiro.

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

Ensaio sobre sombra e identidade de brasileiros no Japão III

Feliz 2019 diretamente de uma cidade que queria muito conhecer chamada Beppu que fica na província de Oita na ilha de Kyushu, sul do Japão. Aqui sigo minha aventura e aprendizado e nas horas vagas escrevendo aqui no blog esse ensaio.
Como se forma a sombra, ou seja, a identidade?
Escrevi no post anterior sobre a sombra  ser a identidade individual de cada um que é formada desde o nascimento.  A origem da constituição da sombra vem do nosso primeiro contato com os pais pela linguagem. Imagina a alegria dos pais quando os filhos começam a falar, se expressar, saber quando está bem, quando está mal, o que querem. É gracioso uma criança falando, a gente se encanta porque é lindo mesmo, a sombra está se formando. A linguagem por meio do idioma original é a principal constituição da sombra, da identidade de cada um. Mesmo quando as crianças não conjugam corretamente, trocam as letrinhas, o importante é exercitar o idioma da identidade original.
Sabe o que me deixa muito feliz sempre? Quando eu encontro uma placa como essa abaixo escrita em português e espanhol. Fico tão feliz de ver minha língua portuguesa e o espanhol alí na plaquinha, já gostei mais ainda de Beppu. Traduziram "ao Beppu" mas tudo bem, a intenção é a que vale! Ao menos os japoneses se esforçam para receber bem o outro nas suas mais diferentes "sombras", principalmente nos pontos turísticos.


Eu amo meu idioma, o português que herdei por ter nascido no Brasil e amo também o espanhol por ter tido um pai espanhol. Tudo isso para dizer que tanto o português quanto o espanhol fazem parte da minha sombra, da minha identidade. Geoiarinha tem uma sombra de origem e tenho um super orgulho disso! Não tem como eu arrancar isso ou alguém arrancar isso de mim e tenho o maior orgulho desses dois idiomas e desses dois países: Brasil e Espanha. Gostaria de falar melhor o espanhol, mas vou aprimorando aos poucos minha sombra. E o português é a língua que eu penso e me expresso todos os dias e que me permite escrever esse post também.
Onde é que estou querendo chegar? Essa introdução toda foi para tentar explicar como a sombra se forma. Agora vamos complicar porque temos que considerar que vivemos num mundo onde as pessoas migram em busca de melhores oportunidades. A "bolsa mágica" do Peter Schlemihl que sai dinheiro e realiza os desejos nem sembre está no país de origem, a "bolsa mágica" acaba levando muitas sombras a outros países.
Como proteger a sombra considerando que o indivíduo está fora do seu país de origem?
Imagine só como deve ter sido para os primeiros japoneses no Brasil em 1908? Que sofrimento migrar para um lugar em que eles não falavam português. Terrível!Agora pensa no inverso, nos primeiros brasileiros chegando aqui em 1988. Terrível também! O idioma é um dos pilares da constituição da sombra, da identidade. Estar em outro país com pessoas que tem sombra diferente da tua dá uma angústia muito grande.
Muitos japoneses foram enganados no Brasil e muitos brasileiros foram enganados no Japão e isso gera uma insatisfação muito grande. O sonho da "bolsa mágica" esbarra na questão do idioma sempre!
Se você que está lendo esse post, é brasileiro, tem descendência japonesa, ou se casou com descendente de japonês, mora no Japão, trabalha no Japão e fala japonês muito bem...omedetou para você, parabéns! Você tem sombra, você tem identidade. Eu sempre fico encantada de ver meus amigos brasileiros falando japonês, fico encantada mesmo! E se você continua estudando o português aplicado nos mais diversos níveis, ensino fundamental, médio, aula particular, ensino superior presencial ou a distância, especialização......parabéns também por proteger sua sombra de origem.
Resumindo, estudar é um dos meios para proteger a sombra, ou seja, sua identidade. Estudar inglês também vem se constituindo como uma característica bastante apreciável às sombras porque aí então você pode se comunicar com muitas outras sombras de outros países e tornar a sua sombra, a sua identidade mais forte e bonita. Eu adoro conhecer pessoas de países diversos que eu consigo me comunicar, eu aprendo tanto. Mas se eu não soubesse me expressar em outros idiomas, sem dúvida eu me sentiria péssima.
Mas eu sei que infelizmente tem muitos brasileiros que estão no Japão por muitos anos que NÃO sabem japonês e NÃO sabem o português, não estudam nem um e nem outro mas tem a "bolsa mágica" que sai dinheiro e compra tudo o que querem. Saber um pouco, o japonês das fábricas, isso não é saber japonês ou o japonês do "kore, iti". E saber português de escrever no facebook também não é saber português. ESTUDAR protege a sombra!
Puxa vida, "mas eu não tenho tempo", gente eu ficava muito arrasada de escutar pessoas já "sem sombra" dizendo isso. Há muitos que vivem o encantamento da bolsa mágica do Peter Schlemihl. Frases do tipo: "A vida aqui é assim, trabalhamos bastante e só descansamos para poder trabalhar mais." Mas o importante é que se compra muita coisa e se "vive bem" no Japão.  Tá vendo como é complexo para chegarmos a uma conclusão bastante óbvia e até clichê: dinheiro não compra felicidade. Tem muitos brasileiros felizes com as conquistas materiais e super orgulhosos mas lá no fundo é visível a tristeza. Quem acorda feliz e contente para fazer um trabalho repetitivo, pesado, que machuca, que deixa marcas por 12 horas durante 6 dias da semana, sim porque muitos trabalham de sábado. Eu super admiro essas pessoas, de verdade, é impressionante pra mim isso. Eu falo isso sempre para meus amigos, como vocês conseguem? Há muitos Peter Schlemihls no Japão que se encantaram num primeiro ano com a bolsa mágica e muitos não vão largar a "bolsa mágica" por nada nesse mundo. Fiquei arrasada de saber que um brasileiro que eu conheci recentemente se matou,  ele tinha a posse da sombra mas a alma dele era da fábrica, era do Japão.  Ele havia passado férias no Brasil e estava super contente de ter visitado o nosso país, mas tinha que voltar para onde ele trocou ter a sombra de volta concedendo a alma. A alma desse brasileiro ficou no Japão literalmente.
Como recuperar a sombra?
Alguma dúvida que eu vou escrever que ESTUDAR recupera a sombra. Os coreanos tem um status diferente aqui no Japão porque eles enfrentam os japoneses de igual para igual simplesmente porque os coreanos além de estudarem japonês, eles estudam inglês e se qualificaram nos estudos formais e alcançam postos de trabalho altos aqui. Quero deixar bem claro que você pode morar onde quiser, trabalhar onde quiser mas é bom proteger sua sombra, sua identidade: estude, se qualifique, lute no idioma da onde você está para que o certo seja realmente certo. Não aceite situações erradas impostas pelas empreiteiras ou pela empresa.
As pessoas "sem sombra", sem identidade, aceitam numa boa fazer coisas erradas no ambiente de fábrica ou da empresa, nos contratos de trabalho. As pessoas "sem sombra" não vêem nenhum problema em aceitar maracutaia porque tem maracutaia no Japão SIM. Eu senti na minha pele e fiquei bem assustada de saber que se faz maracutaia no Japão, mas essa é uma outra história! Que mal há em assinar um contrato que paga menos impostos e você "vai ganhar" mais. Muitos brasileiros que aceitam isso, não tem sombra. Se você não estuda, você tranquilamente aceita o errado e contribui para punir o certo. Mas se você tem sombra, tem identidade, você faz o que é certo e pune o errado. Por sorte eu tenho sombra, não me vendo por "bolsa mágica" nenhuma e nem fico vislumbrada com Japão como as pessoas sem sombra costumam  ficar. Uma característica bem marcante das pessoas "sem sombra" que está até numa pesquisa feita pelo consulado. Muitos brasileiros que venderam "sua sombra" pela bolsa mágica tem um padrão bem típico de falar muito, mas muito mal do Brasil. Tudo no Brasil é ruim, tudo é péssimo, nossa que lugar abominável de se viver. É preciso ter uma boa justificativa por ter aceito a "bolsa mágica" e esse é um padrão bem característico.
Sabe por que eu escrevo isso sem o menor medo de me criticarem? Primeiro porque eu tenho sombra, eu tenho identidade e me orgulho muito dela. Segundo porque eu conheci pessoas maravilhosas aqui no Japão que ajudam os brasileiros a recuperarem a sua sombra, a sua identidade! Quando você conversa com as pessoas com sombra aqui no Japão, eu percebo que o mundo não está totalmente perdido. Acho até que talvez tenha sido um dos maiores aprendizados que tive na minha vida vivendo aqui no Japão com brasileiros. E "A História maravilhosa de Peter Schlemihl" é realmente maravilhosa e super atual para a realidade que eu vivenciei. Vou deixar esse livrinho no Japão para essa minha amiga muito querida que ajuda brasileiros a recuperarem a sombra.

Em tempo, faltou eu explicar o Thomas John no post anterior que era para prestar atenção que eu falaria dele depois. Pois é, o Thomas John é o exemplo acima do brasileiro que morreu no Japão. O Peter Schlemihl perguntou ao sujeito do casaco de cinza se o Thomas John tinha assinado vender a alma, daí o homem do casaco cinza tira do bolso a alma do Thomas John. Quando o Peter Schlemihl vê a alma saindo do bolso, ele decide jogar a bolsa mágica fora e vai embora com o que sobrou da bolsa mágica e sai pelo mundo para ter outras experiências. O Peter Schlemihl não vendeu a alma, que lindo né.  Por isso eu falo muito para alguns amigos muito queridos que tenho aqui no Japão, se não está feliz aqui, "larga essa bolsa mágica" o quanto antes e vá viver em outro lugar ou voltar ao Brasil.

Espero que tenham gostado desse ensaio em três posts sobre a história maravilhosa de Peter Schlemihl e minha experiência no Japão. Vou trazer nos próximos posts alguns exemplos super interessantes que conheci aqui que valem muito a pena refletir. Gostei de voltar a escrever no blog e espero que tenham gostado dessas reflexões.